Edição lançada em 18/09/2014
Editorial 2
Disse Godard sobre os tempos da Cahiers: “Escrever já era fazer cinema, pois, entre escrever e filmar, há uma diferença quantitativa, não qualitativa”. Cahiers é o grande expoente quando se pensa em crítica cinematográfica e seu nome reverbera até hoje entre críticos e publicações voltadas à crítica, mesmo no Brasil. Esbarrar na Cahiers du Cinéma – e já aqui falamos de forma reducionista, já que a revista teve diferentes fases e continua viva – é inevitável, sobretudo sobre textos mais badalados, como “A Arte de Amar” e “Da Abjeção”.
A citação que abre este segundo editorial tem um duplo sentido. Primeiramente, traz nosso primeiro “esbarro” na Cahiers, essa ideia de que escrever sobre cinema é também, de alguma forma, fazer cinema. Uma ideia na cabeça e duas mãos no teclado (já que estamos falando de referências, vale brincar com a frase de Glauber, repetida à exaustão por nove entre dez calouros ansiosos de faculdades de cinema). Acreditamos que mesmo de nossas casas (não, não temos uma redação!), com nossos notebooks em punho, fazemos cinema porque, simplesmente, pensamos cinema. O cinema pulsa, atravessa, vai além de seu encerramento, seja como produto ou ritual. Acontece mesmo após os créditos.
O segundo ponto em torno da frase de Godard é uma espécie de exorcismo: citamos Cahiers e, agora, ela já não é um fantasma a nos perseguir. Porque não queremos ser Cahiers, e mesmo que quiséssemos, jamais conseguiríamos, dadas as diferenças de contextos e formação (a cinefilia hoje, incluindo a nossa, nos parece muito mais acomodada do que era segundo relatos da gênese da revista francesa). Mas o que somos? Somos honestos (ao menos, achamos… ou assim tentamos). Somos uma revista de estudantes de cinema (alguns dirão que nem revista somos!) que se digladiam contra a pasmaceira da cinefilia, da academia e do próprio circuito cinematográfico (além das nossas próprias pasmaceiras), para, quinzenalmente, colocarmos online nossas inquietações sobre os filmes, escritas e revisadas em meio aos atropelamentos das tantas atividades diárias.
Escrever sobre cinema é um desafio, sobretudo em tempos em que ver cinema é também um desafio (e nem vamos entrar no mérito da produção). Desafio aceito aqui por pessoas no caminhar de suas formações, com todas as potências e lacunas que essas formações muito plurais apresentam. Colocamos isso aqui com muita humildade (algo que, por vezes, falta à crítica). Não diremos que descemos desse púlpito no qual a crítica cinematográfica frequentemente se instaura pelo simples fato de que nunca chegamos a subir nele. Esperamos nunca subir (e se o fizermos, por favor, nos puxem as orelhas). O diálogo aqui é reto, de igual para igual.
Dito isso, nesta edição continuamos com nossa tendência de atirar para todos os lados. Diversificamos os alvos, na verdade. Marcella Grecco fala de A Caça, do dinamarquês Thomas Vinterberg. Phillippe Watanabe, Renato Coelho e Gabriel Carneiro ficam na diversidade das imagens nacionais; o primeiro analisando o recente O Lobo atrás da Porta, o segundo versando sobre o curta Linguagem, de Luiz Rosemberg Filho, o terceiro abordando Estrela Nua, atrelado ao cinema Boca do Lixo. Por fim, Álvaro André Zeini Cruz fala sobre o videoclipe Chandelier (na coluna “Etc.”), da cantora Sia, e traça um paralelo entre as séries Mad Men e Breaking Bad.
Boa leitura.
Álvaro André Zeini Cruz e Gabriel Carneiro
editores
Textos desta edição: