Edição lançada em 03/09/2014.
Editorial 1
Começamos em crise. E assim esperamos permanecer. A crítica nasce da crise, e, para nós aqui, ela parte do cinema – ou melhor, de buscar colocar o cinema em crise, de questioná-lo. Mas a crise não se delimita ao crítico ou ao cinéfilo; qualquer espectador, por mais eventual, é capaz de ter esse diálogo problemático, com convergências e distanciamentos, que é a crise, a crítica. Uma conversa que vai surgindo durante o visionamento da obra e vai se construindo de forma cumulativa, mas que só se completa quando a obra, o filme, também encontra sua completude. Ou seja, após os créditos.
A concepção da crítica de cinema propriamente dita – essa atividade que envolve o ato de cravar no papel palavras que colocam em crise as imagens – ocorre quando o crítico encerra o visionamento da obra (a priori, deveria ser assim). Pode aparecer minutos após, sob a paixão (ou o ódio, que também é paixão) fulminante pelo filme. Mas pode ser que aconteça dias, semanas, meses depois, cristalizada sob a lucidez afetiva da memória. Até aqui, falamos o óbvio. Mas a crítica para o leitor também surge após o visionamento da obra. Ou assim deveria ser. De qualquer forma, é nesta crítica que acreditamos: uma crítica que não seja guia, mas que seja enfrentamento. Enfrentamento entre duas percepções sobre um filme, enfrentamento entre a sensibilidade do crítico (reproduzida no texto) e a sensibilidade do leitor que já viu o filme. Ou seja, temos um ringue com três lutadores: crítico, filme (que também é crítico) e leitor (que também é crítico). No final, tudo é crise.
“Pós-créditos” nasce em busca de uma crítica que, como qualquer crise, está sujeita a erros e equívocos. Uma crítica que seja lúcida, mas não racionalizada a ponto de sufocar a paixão ou de perder seu lugar no tempo; mundana, em sua essência. Uma crítica que seja apaixonada, mas não obsessiva a ponto de ser egoísta. Uma crítica que vá aos filmes, mas que chegue também ao leitor (e não só ao leitor cinéfilo). E nesse emaranhado de crises e paixões, buscamos, claro, a pluralidade de ideias e interesses, algo perceptível já nesta primeira edição: Marcella Grecco analisa o filme A parede, de Julian Pölsler; Phillippe Watanabe fala sobre a série True Detective; Renato Coelho se debruça sobre Corpo presente, de Marcelo Toledo e Paolo Gregori; Gabriel Carneiro trabalha a trilogia de Trancoso de Augusto Sevá; e Álvaro André Zeini Cruz escreve sobre O mundo perfeito, de Clint Eastwood.
“Pós-créditos” é realizada através do programa SAE Ação Cultural da UNICAMP, e desenvolvida por alunos dos cursos de Multimeios e de Midialogia desta mesma instituição. E agora, sem mais delongas, vamos aos filmes. E, claro, às críticas, mas só após os créditos!
Benvindos.
Álvaro André Zeini Cruz e Gabriel Carneiro
editores
Textos desta edição:
“Uma cartografia de Trancoso segundo Augusto Sevá”
“Corpo Presente, ou um estranho herdeiro da Paraísos Artificiais”