Pergunte aos seus filhos

Por Phillippe de C. T. Watanabe

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As ilusões são parte da existência humana. Sem elas possivelmente seria impossível aguentar o cotidiano. Talvez uma das maiores ilusões dos seres humanos seja a ideia de “resposta”. É a busca genérica mais antiga e ainda a mais distante de ser alcançada – considerando a ilusão de que um dia será. Buscamos respostas para cada detalhe do mundo e nunca as encontramos. Somos, então, induzidos a associar a possibilidade de alcançar respostas à experiência de vida. Passamos a acreditar que, com o acúmulo dos anos, os problemas serão digeridos com maior facilidade e soluções surgirão em nossa frente. Enquanto Somos Jovens (While We’re Young, 2014) tenta nos afastar disso, enquanto fala de nossa eterna juventude na Terra.

O filme, inspirado na peça Solness, o Construtor, de Henrik Ibsen, conta a história de Cornelia (Naomi Watts) e Josh (Ben Stiller), casal que começa a ter que enfrentar o peso da passagem dos anos e as consequências das decisões que moldaram suas vidas. Enquanto assistem, quase horrorizados, um casal de amigos com seu filho recém-nascido, têm que confrontar o fato de terem desistido de ter filhos e dessa opção ser quase impossível no momento. Tentam olhar os pontos positivos de não ter a responsabilidade de criar uma criança, e percebem que dispuseram de maior liberdade, porém não a usufruíram. Um dos obstáculos para tal foi o longo processo – 10 anos – para a realização do ainda inacabado segundo documentário de Josh.

Frente às dúvidas que buscam solucionar, surge um jovem casal – Jamie (Adam Driver) e Darby (Amanda Seyfried) – que parece trazer um sopro de vida – ou qualquer vento que faça algo se mover – à realidade de Cornelia e Josh. O tempo parece se encher de leveza e vitalidade antes totalmente perdidos, e, aos poucos, a dupla protagonista começa a se inspirar no modo de vida do jovem casal.

As mudanças vão desde a aparência até o modo de agir e trabalhar. Surgem chapéus da moda e uma tentativa de atitude menos possessiva em relação ao trabalho. Jamie e Darby, o casal que aparentemente tem tudo sob controle, são algo em que se espelhar. Até o momento em que se mostram. Aqui reside um dos pontos fortes do filme. Adam Driver consegue transmitir um certo tipo de perigo e cinismo que o papel pede. O inicialmente descompromissado, leve e quase bobo Jamie vai se revelando, cada vez mais, um ser manipulador de todos à sua volta. Os movimentos são extremamente calculados. A falta de consideração com os outros também fica evidente – tudo é válido para alcançar o que quer. Contudo, além da boa atuação, graças a uma personagem bem escrita e dirigida, Jamie não se torna monocromático, passível de ser definido como bom ou mau. Infelizmente, Darby acaba secundária na história, o que se alinha ao tratamento que Jamie direciona a ela.

Noah Baumbach – responsável pelo recente e elogiado Frances Ha – consegue dirigir o filme de forma a desenvolver as personagens e evitar a criação de heróis ou vilões. Todos estão em busca de algo, todos têm interesses, mas isso não os torna, por si só, bons ou ruins. Há, ainda, um ótimo ponto de equilíbrio entre o tom cômico e o dramático, havendo variações entre eles dentro de uma mesma sequência – como na discussão entre Cornelia e Josh que Jamie insiste em filmar, irritando e atrapalhando o casal. A câmera de Baumbach está sempre acompanhando as personagens de perto, o que leva ao predomínio de primeiros planos. Ficamos íntimos daqueles que aparecem na tela, e seus medos ressoam em nós ao passo que partilhamos o sentimento de estranho isolamento experimentado pelo casal protagonista, que se encontra numa espécie de limbo geracional.

Cornelia e Josh finalmente percebem quem são e em que momento da vida estão. Graças aos jovens que os cercaram – independentemente de suas intenções –, conseguem realmente crescer e parar de se sentir como “uma criança imitando um adulto”. Está quebrada a ilusão de que sempre os mais velhos ensinarão valiosas lições aos mais novos. E é sobre isso a última sequência do filme, na qual Cornelia e Josh observam, levemente apavorados, incrédulos, uma criança em seus primeiros anos de vida que mexe com desenvoltura num smartphone. Tudo indica que as lições para o casal protagonista só começaram e que, talvez, as respostas que tanto buscam poderão vir nas primeiras palavras ditas por uma criança.

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